05/04/2025
Novo mapa 3D do Universo desafia modelo padrão da Cosmologia
Se as conclusões se confirmarem, nossas mais confiáveis teorias cosmológicas podem estar equivocadas.

[Imagem: DESI Collaboration / DOE / KPNO / NOIRLab / NSF / AURA / R. Proctor ]
Em 1998, o anúncio de que a expansão do Universo parecia estar acelerando provocou uma revolução em nosso entendimento astronômico. A aceleração foi atribuída a um tipo de energia misteriosa, chamada de energia escura, que exerce uma força gravitacional ao contrário (antigravidade), gerando repulsão em vez de atração.
Essa força é tradicionalmente considerada constante e, por isso mesmo, associada a uma grandeza física chamada constante cosmológica (Λ).
Entretanto, pesquisas mais recentes sugerem possíveis variações na energia escura ao longo do tempo. Parece que ela está enfraquecendo, o que pode comprometer a confiabilidade dos modelos cosmológicos atuais.
O novo estudo utilizou os conjuntos de dados finais do DESI - Dark Energy Spectroscopic Instrument (Instrumento Espectroscópico de Energia Escura). Ao construírem o maior mapa em 3D do Universo, os astrônomos envolvidos na pesquisa encontraram variações que, se confirmadas, indicarão que a energia escura, na verdade, não é uma constante.
No Universo primordial, quando tudo estava mais aglomerado, a gravidade era capaz de superar a energia escura. À medida que o espaço se expandiu, a atração gravitacional entre as galáxias e seus halos de matéria escura foi enfraquecendo.
No entanto, enquanto essa atração diminui com o aumento da distância, uma energia escura constante continuaria exercendo a mesma força repulsiva. Assim, cerca de 5 bilhões de anos atrás, a força gravitacional tornou-se inferior ao poder da energia escura, e a expansão do Universo passou a acelerar.
Pelo menos, é isso o que sempre se pensou. Mas os novos dados do DESI estão colocando toda essa teoria em xeque. Localizado no Observatório Nacional Kitt Peak, no Arizona, o DESI é um instrumento incrivelmente poderoso, capaz de observar 5000 galáxias simultaneamente.
Na divulgação dos novos dados, os astrônomos analisaram três anos de observações, abrangendo 15 milhões de galáxias e quasares. Os resultados foram publicados em um grande volume de artigos postados no servidor de pré-impressão de Astronomia arXiv.
Isoladamente, esses dados são plenamente consistentes com os modelos cosmológicos padrão, inclusive com a constante cosmológica. Somente quando combinados com outras observações é que surgem discrepâncias mais significativas.
Com a inclusão de observações da radiação cósmica de fundo em micro-ondas (o brilho residual do Big Bang), lentes gravitacionais e supernovas distantes, os dados se ajustam mais coerentemente à hipótese de que a energia escura não é constante, mas sim que agora está enfraquecendo.
A primeira leva de dados do projeto DESI, divulgada em 2024, já trazia indícios sutis de que a energia escura poderia ser dinâmica. O novo conjunto, agora apresentado, com mais do que o dobro de volume, fortalece ainda mais essa ideia.

Adicionalmente, resultados do DES - Dark Energy Survey (projeto de nome semelhante, mas independente) - recentemente apresentados na Cúpula Global de Física da Sociedade Americana de Física, na Califórnia, também apontam para uma força repulsiva que varia ao longo do tempo.
No entanto, a polêmica ainda está longe de ser resolvida. Segundo Andy Taylor, do Observatório Real de Edimburgo, no Reino Unido — que não esteve envolvido na pesquisa — "ainda é possível que a discordância seja um acaso estatístico, ou que algum viés nos dados esteja causando os resultados".
Mas não há dúvidas de que, se dados futuros confirmarem esses resultados, o avanço será notável. "Se essas descobertas puderem ser confirmadas, isso será realmente revolucionário — sem dúvida uma descoberta maior do que a expansão acelerada", afirma Henk Hoekstra, da Universidade de Leiden, na Holanda, também não envolvido na pesquisa.
Se a força da antigravidade continuar crescendo, um Big Rip poderá destruir toda a estrutura do Universo em cerca de 22 bilhões de anos. No entanto, à luz dos novos resultados, esse cenário parece um pouco menos provável. Seja qual for sua natureza, o comportamento da energia escura é determinante para o futuro do Cosmos.
Glossário Básico
Constante cosmológica (Λ): termo introduzido por Einstein, representa uma forma de energia associada ao vácuo e que age contra a gravidade, provocando a aceleração da expansão do Universo.
Energia escura: forma hipotética de energia, de natureza exata ainda desconhecida e presente em todo o espaço, à qual se associa a constante cosmológica, sendo, portanto, responsável pela aceleração da expansão do Universo.
Lentes gravitacionais: fenômeno previsto pela Teoria da Relatividade Geral, em que a luz de objetos distantes é distorcida pela gravidade de grandes massas (como galáxias), gerando uma lente natural no espaço.
Radiação cósmica de fundo em micro-ondas: radiação remanescente do Big Bang, presente em todo o Universo, que fornece pistas fundamentais sobre sua origem, estrutura e evolução.
Big Rip: hipótese segundo a qual, caso a aceleração da expansão do Universo se intensifique demasiadamente com o tempo, galáxias, estrelas, planetas e até mesmo os átomos serão desintegrados - um colapso cósmico total em bilhões de anos.
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★ Referências:
- T. M. C. Abbott et al. Dark Energy Survey: implications for cosmological expansion models from the final DES Baryon Acoustic Oscillation and Supernova data. arxiv.org, 09/03/2025.
- M. Abdul-Karim et al. Data Release 1 of the Dark Energy Spectroscopic Instrument. arxiv.org, 18/03/2025.
- Latest Dark Energy Survey Data Suggest Possible Variations in Dark Energy Over Time. NOIRLab.edu, 19/03/2025.
- New data hint that dark energy is weakening over time. If true, it means that our most trusted cosmological models may be wrong.. Sky & Telescope, 25/03/2025.